quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Mundo de faz-de-conta

No ano de 2010, minha mãe sentia que suas pernas estavam inchadas e que ela estava com mais cansaço que o normal, mas não chegou a ir ao médico pra ver se algo estava errado. Ela apenas achava que estava engordando e envelhecendo.
Em agosto do mesmo ano minha avó faleceu e tanta correria fez com que minha mãe ficasse ainda pior. Ela começou a desenvolver crises nervosas, suas mãos atrofiavam e ela sentia fortes dores na nuca. Ficava horas no hospital em quase todos os dias e as medicações apenas traziam uma melhora temporária.
Minha mãe começou a passar por vários médicos que insistiam que ela estava com depressão por causa da perda da minha avó, mas sabíamos que ela estava bem emocionalmente, mas não conseguíamos nenhum médico que aceitasse esta hipótese para que ela pudesse se curar. Inclusive a grande maioria dos médicos receitavam remédios fortíssimos para manter minha mãe dormindo a maior parte do tempo. Ela passou praticamente um mês inteiro na cama.
Como tudo tem seu propósito, creio que minha mãe passou por isto para dar uma lição de vida para muitas pessoas. Os médicos a mandaram para um grupo de apoio onde as pessoas contam seus problemas a uma psicóloga que analisa as situações entre eles.
Minha mãe ficava sempre em silêncio, observando o que as outras pessoas passavam: solidão, desprezo, depressões, pessoas que não tinham nem o apoio da própria família. Um dia a médica a interrogou. Perguntou sobre a morte de minha avó e como era a vida que minha mãe levava. Ela respondeu que estava conformada com a morte de sua mãe, que sentiria sua falta, mas que já tinha entendido e não estava mais sofrendo com isto. Disse também que meu pai era um ótimo marido, que a tratava como princesa, suas filhas não davam trabalho, tinham estudo e eram obedientes. Afirmou com todas as letras que era uma pessoa feliz.
A médica não aceitou esta versão da história. Ela achava que minha mãe estava louca ou inventava tudo aquilo para fugir do tratamento e dizia à minha mãe que ela vivia em um mundo de faz-de-conta. Era tão impossível para a médica que as pessoas pudessem ser felizes que ela encaminhou minha mãe para uma psiquiatra (afinal, minha mãe era louca por ser feliz).
Enquanto a medicina duvidava da felicidade da minha mãe, os pacientes criaram uma espécie de esperança e passaram a pedir conselhos à minha mãe, para que eles aprendessem como serem realmente felizes. Até o momento eles só ouviam dizer que era impossível ser feliz e que tínhamos que aceitar a realidade em que vivíamos.
Ao passar pela psicóloga, minha mãe foi interrogada como se estivesse resistindo a qualquer tratamento. Com o tempo a médica percebeu que minha mãe realmente não era louca e que estava apenas com os nervos abalados. Além disso, sua pressão (que foi baixa durante toda a vida) tinha mudado para alta.
Após algumas sessões de acupuntura e tratamento com remédios de pressão, minha mãe foi melhorando.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Minha própria cidade

A melhor coisa em ser criança é a falta de preocupações com compromissos, falta de contas para pagar e ter tempo de sobra pra fazer qualquer coisa.
O que eu mais gostava de fazer quando era pequena, era brincar de faz de conta com situações verdadeiras. Por exemplo, se eu ia na igreja, ao chegar em casa eu fazia todos os meus bonecos e ursinhos de pelúcia iam na igreja também. Se assistia ao desfile cívico de Independência, todos os bonecos tinham que desfilar, entre tantas outras situações. Me divertia muito com isso!
Mas a melhor de todas as brincadeiras da minha infância era brincar de cidadezinha. Eu riscava o quintal inteiro com giz, fazendo casas e quarteirões, separava todos os meus bonecos e ursinhos em famílias, colocava móveis de casinha e peças de lego para decorar as casas, fazia estabelecimentos para poder empregar os pais de família e os filhos eram separados em séries e iam para a escola em turnos. Eu, por minha vez, era a motorista de ônibus. Tinha uma pequena bicicleta com um cesto na frente, onde eu colocava os passageiros para levá-los para seus locais de trabalho, escola, casa, durante todo o dia. Era o tipo de brincadeira que eu poderia brincar durante dias sem me cansar.
E eu cheguei a esta conclusão cedo o bastante para que a brincadeira se tornasse em algo "eterno enquanto possível". Desenhei o mapa da cidade em um caderno, onde escrevi quem fazia parte de cada família, onde moravam, o que possuíam, onde trabalhavam, em qual série estavam as crianças, para que todos os dias eu pudesse montar tudo como estava no dia seguinte, quando minha mãe dizia que já era tarde para ficar brincando no quintal ou quando meu pai chegava com o carro e eu tinha que tirar a cidade da garagem.
Certa vez, resolvi brincar de cidade dentro de casa. Espalhei as famílias no meu quarto e não era possível apenas andar de bicicleta lá dentro. Justo neste dia minha irmã levou duas colegas de classe para minha casa. Por sorte, consegui que elas não tivessem contato com o fogo para incendiar a casa, pois foi apenas o que faltou. No fim do dia, estava lavando a louça antes que minha mãe chegasse e as amigas estranhas da minha irmã entraram no quarto e começaram a arremessar toda a cidadezinha pela janela (se eu pudesse, teria amarrado aquelas duas até que alguém tomasse alguma providência). Minha irmã não tinha controle da situação e na hora que minha mãe chegou tinha bonecos jogados até na cozinha.
Minha irmã ficou um tempo sem levar amigas para casa depois disso...

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

Arrumando um emprego

Já imaginou se você estivesse desempregado, sem mandar currículo, andando no supermercado com sua família e ganhar um emprego de repente? Impossível? milagre? Mas aconteceu...
Há alguns anos, todos da minha casa trabalhavam no mesmo lugar, numa oficina de costura. Minha mãe e eu costurávamos, minha irmã era auxiliar e meu pai realizava entregas. Com a crise e outros problemas de força maior, a empresa que nos mandava serviço encerrou a parceria. Eu, minha mãe, minha irmã e minhas tias procuramos outros lugares para nos mandar serviço, mas não era suficiente para bancar toda a família. Meu pai, por sua vez, não conseguia emprego em nenhum lugar. A situação não era favorável, ele tem apenas o ensino médio completo e sua últica vantagem competitiva é uma carteira de habilitação D, mas mesmo as empresas de transporte coletivo não estavam contratando.
Fomos a um supermercado do centro da cidade (que dificilmente frequentamos) e meu pai encontrou um amigo que não via há muito tempo. Ele contou a ele sobre sua situação e o amigo disse que tinha uma vaga em uma empresa prestadora de serviços e que ele deveria mandar seu currículo.
Meu pai estava de chinelo, bermuda, camiseta, óculos escuros e barba por fazer e resolveu passar na empresa apenas para deixar seu currículo e esperar talvez ser chamado.
Do supermercado fomos direto para a empresa que o amigo do meu pai comentou. Meu pai desceu do carro e foi até a portaria para entregar o currículo e fomos embora em seguida.
Mal saímos com o carro daquele bairro, o dono da empresa ligou para que o meu pai fosse lá imediatamente. Meu pai foi do jeito que estava, fez uma entrevista e foi contratado e trabalha lá até hoje.