sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Saudades

Se tem uma coisa estranha de se acontecer é perder alguém querido. Perder pra sempre, sabe? Saber que depois de uma certa data você nunca mais vai falar com uma pessoa, nem vê-la na rua e só te restarão lembranças. É muito esquisito lidar com isto!
Hoje é o primeiro aniversário de morte da minha avó e ainda parece que foi ontem. Toda a família reunida em uma grande homenagem à matriarca de uma família gigante. Mãe de 12 filhos, avó de 17 netos  e bisavó de 3 bisnetos, ela nunca perdeu o bom humor e o carinho por todos.
Quando a nossa família se reúne é uma festa e era só a Vó Lita (como era e ainda é conhecida) chegar que a festa estava completa. Com mais de oitenta anos de idade ela colocava todo mundo pra dançar e ainda criava as coreografias.
Ela trabalhava com a minha mãe e minhas tias na oficina de costura e eu cheguei a trabalhar com ela também. Ela amava costurar e trabalhava atrás da minha mãe. Às vezes começava a cantar "Quando Jesus estendeu a sua mão" e minha mãe a acompanhava.
Quando eu comecei a trabalhar em Campinas ela ficou desesperada. Falou que eu estava emagrecendo, que minha mãe tinha que me mandar uma marmita e que eu ainda era muito nova pra ir sozinha para outra cidade.
Ela gostava de inventar os nomes para as coisas. Um dia ela chegou pra minha mãe, perguntando se tinha tampa pra ela virar. Minha mãe achou esquisito e pediu que ela repetisse. Ela repetiu a mesma coisa e demorou pra entenderem que ela estava pedindo para virar lapelas (aquele pedaço de tecido costurado que fica em cima do bolso da bermuda, pra parecer que ele está fechado). E virou tampa!
Ela não podia ver jogo de futebol na televisão que parava pra assistir. Não sabemos até hoje se ela realmente sabia as regras do jogo, mas ela gostava de passar horas na frente da televisão torcendo para o time que estiver ganhando, mesmo que fosse futebol amador.
Um dia ela estava assistindo televisão quando minha tia chegou em casa e ela disse super empolgada: "Olha, Lu, que lindo! Tudo tão colorido!". Minha tia parou pra ver o que era tão lindo e colorido e viu que minha vó estava assistindo a parada gay.
Algumas frases dela fizeram história e são guardadas até hoje por seus filhos e netos. Quando alguém espirrava, ela dizia "Deus te crie". Quando pedíamos benção, ela dizia "Deus te dê boa sorte". Quando alguém chegava com alguma fofoca, ela dizia "Olho viu, boca piu" e para tudo ela tinha uma resposta.
Ainda é meio vazio quando nos encontramos e ela não está. O primeiro natal sem ela foi muito diferente. Não conheço sequer uma pessoa, mesmo não sendo da nossa família, que não tenha guardado uma boa lembrança dela. Até os motoristas e cobradores dos ônibus que ela pegava eram amigos dela. Ela levava bala pra eles e fazia amizade com todo mundo.
No seu velório, estávamos meio chocados e meio desacreditados. Minha prima comentou comigo: "Sempre pensei que ela fosse eterna. É estranho vê-la nesta situação."
E acredito que ela seja realmente eterna. Vó lita, Dona Anita ou simplesmente Gildete. Cada um a conhece de algum jeito e levará pra sempre a lembrança de uma senhorinha alegre, disposta e carinhosa.

Um comentário: